É
possível uma psique que não esteja nem dentro, nem fora? Uma
psique que não seja entendida como consciência, alma, eu ou
comportamento? Ou seja, uma psique que seja a vida em ato, vida
vivida? Uma pisque não categorizável pelo comportamento observado,
por um lado, nem mesmo pela consciência que reflete sobre si mesma,
por outro lado, é possível? Podemos pensar uma psique que não
seja o esteio para os objetos a sua volta, que não seja uma
substância incorpórea nem o resultado de operações químicas? Ou
seja, uma psique não pensada? Podemos pensar o não pensado? Que a
resposta seja não é apenas o pretexto, necessário, para essa
constatação: a psique é algo arbitrariamente presumido, e que, na
maioria das vezes, não se dá conta disso. Todas as abordagens da
pisque são formas de pensar ou atuações do pensamento humano, que
a cria. A questão
que me coloco aqui é: se percebo que tudo que falamos sobre psique é
criação do pensamento, há alguma abordagem que não seja
mais uma cria do pensamento? Se digo que não, que não há como escapar do pensamento,
então me vem a pergunta se ele é
reflexivo, se o pensamento é capaz de perceber a "si mesmo", uma percepção que não seja ela mesma mais um pensamento! Mas espere: este "si mesmo" já
é, de antemão, um pensamento! É o pensamento que cria o “si
mesmo”. Perguntar se o pensamento é capaz de perceber-se a si,
é um laço cujo nó é ao mesmo tempo final e início da corda que
produz esse mesmo laço. É o pensamento, que diz que existe, que se
pergunta se é capaz de se perceber perguntando se existe. Pensar,
logo existir, pode significar não que exista algo que pensa, mas que
o próprio pensamento pensa, ainda que desnecessariamente, a si mesmo, que pensar e existir são,
portanto, a mesma coisa. Ora, o pensamento, como uma existência, não
precisa pensar-se. Isso não é uma necessidade de operação. O pensamento, como um existir, pode simplesmente
pensar, existir. É na reflexão, no laço impossível de uma corda
cujo nó é dado simultaneamente pelo início e fim, pelas pontas
opostas habitando o mesmo espaço-tempo, que o existir vira ser, que
o pensamento é. Numa operação desnecessária daquilo que simplesmente existe. Ou seja, numa operação isenta de lógica,
num reflexo infinito de espelho contra espelho, a existência
magicamente, fortuitamente, desvela aquilo que é. Pode a psique apenas ser? A
psique como aquilo que é? Embora esse texto seja uma operação do pensamento,
aqui há uma tentativa de criar uma imagem que dele se liberte.
Aquilo que é escapa ao pensar? Não respondo, pois ainda é uma
pergunta do pensamento. Existir é ser irreal a ponto de
pensar-se para além da existência. Mas veja que contradição na
linguagem aqui empregada. Existir não é ser coisa alguma! Não sabemos o que é.
Aquilo que é nós não sabemos. Existimos, irreais ou reais,
simplesmente existimos. Mais: o existir reflete. Então, nessa reflexão, coisas
espetaculares acontecem... um táquion desacelera, uma célula
imaginal acelera, um nó impossível se faz. Um buraco sem vazio, um
salto num abismo sem nada que o sustente, uma renúncia a um
exercício de poder, pois o pensamento é poder também... uma
renúncia que permite um encontro sem pares, uma vida vivida que não é entendida em termos de ser, pensar. Uma psique que em sua passagem não deixa pegadas. Será isso o amor?